segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Não te quero submissa!

Alguns discos nos fazem pensar que se a história da música brasileira não seguiu outro rumo não foi por falta de bifurcações aventurosas, daquelas que nos levariam por estradas secretas e inexploradas, repleta de visões desconhecidas, cindindo a obra de um artista ou banda, como Sgt. Peppers, Their Satanic Majesties Request, Bringing it all back home, Tommy, para exasperação de fãs acomodados e do marketing de gravadoras.
No Brasil o rock foi sempre muito filtrado pela mídia, tratado com muita distância, em plena ditadura ou ainda sob seus efeitos (nem sempre degenerativos). Pois apesar de infernizarem a vida dos pobres subversivos com censura, exílio e tortura, proporcionaram o clima de contravenção muito saudável para arte. A tropicália soube desfrutar dessa perseguição, aproveitando-se a distância do exílio para intelectualizar e mistificar sua poesia, já que a jovem guarda, apesar de introduzir uma revolução sexual um pouco atrasada e inocente se comparada ao samba, não tinha o brio para para atiçar grandes mudanças de comportamento, algo maior do que lançar ídolos jovens. Roberto Carlos foi nosso Elvis sexual, e nosso Beatles musical, para acabar se tornando esse caquético ícone romântico.
Enquanto Roberto Carlos escalava os picos de audiência da Globo, à sua sombra, autor das composições mais importantes de uma parceria assimétrica, estava o ignorado mau-famado Erasmo Carlos.
Eu tive acesso à essa figura muito antes de compreender sua música, pois minha mãe, fã dedicada que era de Roberto, tinha todos os vinis, e quando pequeno, fuçando sua coleção descobrí o Carlos contra-imagem, podendo assim fazer contraponto a tietagem da minha mãe. Lá eu ia pela rua, com não mais que 5 anos, sol à pino, em calça de veludo branca dizendo ser o Tremendão da vizinhança. Porém, tirando essa fama de mau, eu não dei muita atenção à sua música até pouco tempo, especialmente à um disco, que foi descoberta estupefaciente: Carlos, Erasmo...
Um disco de rock nacional, que seja rock de verdade e nacional de fato, em sintonia com o tempo, é algo raríssimo no Brasil. E quando digo em sintonia, não se trata apenas de um pastiche bem sucedido, mas uma experimentação psicodélica sem clichês, contando com o hérculeo Lanny Gordin, um guitarrista visionário que talvez seja nosso Hendrix, fundindo rock e brasilidade de modo que apenas Pepeu e Lúcio Maia se equiparam, e aquela energia que se espera de um disco de rock setentista. Ele também teve como aliados os Mutantes Serginho, Liminha, Ronaldo, composições de Caetano (De noite na cama), Jorge Ben (Maria Joana), Marcos Valle (26 anos de vida normal, e Dois animais na selva suja da rua), e orquestra sob a a batuta de Rogério Duprat. Mesmo as parcerias com Roberto apontam para outra direção, tais como É preciso dar um jeito meu amigo, Ciça Cecília, Gente Aberta e a sombria Mundo Deserto (Vivo num mundo deserto de almas negras!).
Tive a chance de apreciar a letra de Não te quero santa na voz desafinada às alturas de uma noite inteira de gin tônica, cantada por uma bela amiga que se identificava lacrimejante com essa letra e ali ouví ecos de uma Revolução Sexual abafada.

Um comentário:

Natália Nunes disse...

Olá, Nimrod, nome do primeiro perito em guerra e do primeiro megalomaníaco da terra.

Obrigada pela visita, claro que fiquei lisongeada :)
Fiquei também curiosa qto ao Wesley, nosso amigo em comum, é o Wesley Peres? É que conheço outros. Anyway.

Muito interessante esse blog, voltarei pra ler com calma.


;)